sexta-feira, 20 de março de 2015

Os beijos gays das novelas


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Nathália Timberg e Fernanda Montenegro beijam-se numa cena da novela Babilônia. (Foto: Reprodução/Globo)
Nas últimas décadas tem aumentado o interesse sobre homossexualidade e relações homoafetivas. Se no Brasil o assunto era, em meados do século XX, pauta apenas dos debates acadêmicos, hoje ele permeia os meios de comunicação, especialmente as famosas telenovelas. Não faz muito tempo que a sociedade brasileira se escandalizou com o primeiro beijo gay da teledramaturgia. E agora a Rede Globo, em sua última novela das nove, já promoveu pelo menos dois beijos entre duas atrizes consagradas, logo na primeira semana do folhetim! “Será o fim do mundo?”, perguntam-se alguns pais e mães preocupados, tapando os olhos dos filhos (que, diga-se de passagem, não eram tapados para cenas bem mais calientes de intimidade heterossexual). Enfim, será mesmo o fim do mundo? Ou o começo de uma nova Era?
Na verdade, embora muita gente acredite que a homossexualidade é um fenômeno recente, há diversos estudos antropológicos comprovando que ela remonta aos primórdios da humanidade. Dependendo da cultura, era aceita ou não. O pensamento judaico-cristão se definiu contra a atração afetivossexual entre pessoas do mesmo sexo. Por isso no século XIX, ela foi condenada primeiramente como crime, depois como doença, passando para desvio de norma e enfim perversão sexual. Em 1973, porém, a Associação de Psiquiatria Americana retirou a homossexualidade do rol das doenças mentais. Ou seja: há pouquíssimo tempo! O que significa que o estigma da perversão ainda está muito presente e sustenta a crença anticientífica de que é perigosa a aceitação da homoafetividade como uma variante normal do vínculo amoroso. Os próprios homossexuais possuem, internalizado, o paradigma heterocêntrico em que vivemos, e muitos criticam a banalização, pela mídia, do beijo gay.
Contudo, nada indica que a visão de um beijo entre duas mulheres ou dois homens possa causar qualquer dano ou – como pensam alguns – “despertar” a homossexualidade em alguém. Apesar de muitas pesquisas, tanto da psicologia quanto da biologia, não explicarem definitivamente o que origina a homossexualidade (ao que tudo indica é uma soma de diversos fatores), o que está claro para a ciência é que não se trata de uma opção ou escolha. Sendo assim, é inapropriada a corriqueira expressão “opção sexual”. O certo é falar de “orientação sexual”, e orientação sexual não é contagiosa.
Então, como se explica a proliferação de jovens gays nos últimos anos? Realmente, é provável que as recorrentes abordagens positivas do tema, sobretudo pela mídia, tenham participação nisto! Quando as pessoas vivem num ambiente mais aberto à diversidade e, naturalmente, mais tolerante, é muito mais fácil “saírem do armário” ou se permitirem ter experiências homossexuais! O que não quer dizer que tal tolerância possa gerar a homossexualidade. Pode, sim, provocar a reflexão e a expressão do desejo homossexual, que já existia latente, nem sempre de forma consciente. Talvez hoje não haja mais gays que antigamente, apenas eles se reconhecem e se revelam mais.
Infelizmente, há quem se incomode com os gays não fazerem segredo de sua orientação sexual. Há quem se choque por eles ousarem se beijar como qualquer casal. Essas pessoas prefeririam que os gays nunca saíssem do armário. Afinal, a infelicidade seria deles! Bem, o egoísmo de quem pensa assim impede que se reconheça que pessoas infelizes fazem o mundo infeliz. Isso mesmo. A repressão da homossexualidade provoca mais danos que a sua aceitação. A sua aceitação ainda gera preconceito e pode culminar na rejeição pela família, além de conflitos e tensões inevitáveis. Mas a sua repressão favorece distúrbios psicológicos, que podem gerar comportamentos antissociais. É o tal “efeito borboleta”: todo mundo acaba sendo afetado. Sentir-se amado, aceito e reconhecido é essencial para uma vida emocionalmente saudável. Vidas saudáveis constroem uma sociedade saudável. Se eles se amam, como qualquer casal heterossexual… Que beijem-se da mesma forma! O mal no mundo não é o beijo gay, mas a falta de beijos, a falta de amor e compreensão, a falta de autenticidade. Isso, sim, é perigoso.

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